Página Principal | Download | Biografia | Álbum Fotográfico | Relação dos livros | Links | Artigos |

Perfeição e Individualidade

Pedro Orlando Ribeiro

Pergunta:

Lendo o "Monismo e a Pesquisa Científica", no Vanguarda de janeiro/fevereiro de 99, você diz que os Espíritos foram "criados perfeitos e livres" e que "A criatura que vivia, assim, num sistema hierarquizado, quis ser igual a Deus, seu Criador, advindo daí a queda". (Grifei.) Ora, quando alguém quer ser igual a Deus, o Criador, está imbuído de inveja, de vaidade, de sede de poder, concorda? Concorda, também, que ter esses vícios é sinal de imperfeição, de impureza? Como poderia, então, criaturas criadas perfeitas terem esses vícios?

Resposta:

A dúvida sobre a perfeição das criaturas advém do fato de como definimos o que seja perfeição. Creio que para responder a sua questão primeiro se faz mister compreender o que é a perfeição sob a visão Ubaldiana. Dissemos que as criaturas foram criadas perfeitas, mas esquecemos de acrescentar que eram perfeitas porque pertenciam a um sistema perfeito. Dissemos, no entanto que eram livres e que viviam num sistema hierarquizado. Partindo do principio que Deus criou um SISTEMA PERFEITO é evidente que cada criatura tem um conhecimento proporcional à sua colocação dentro deste Sistema Orgânico. Como exemplo ilustrativo, podemos constatar que este conhecimento proporcional existe no corpo humano, embora este seja um reprodução minimizada do organismo original. Qualquer órgão do corpo é perfeito dentro da sua especialização. O estômago é perfeito no que tange a sua função digestiva, o coração também o é em virtude de sua função no sistema circulatório. Além desta perfeição individual participam indiretamente da perfeição total do organismo através do funcionamento harmônico do todo.

Podemos ver que também na sociedade humana esta harmonia está sendo construída sobre o fundamento da perfeição individual. Cada ser individual da humanidade tem uma vocação diferenciada: uns são especializados na arte (poesia, literatura, música, etc.), outros na ciência (cientistas, professores, médicos, engenheiros etc.), outros na coordenação e administração (estadistas, empresários etc.) e assim "ad infinitum" até nas especializações consideradas pelos nossos preconceitos como as mais humildes. Da evolução do conjunto surgirá no futuro uma sociedade perfeita.

Definido o que seja perfeição, consideremos agora os atributos que definem a individualidade: o egocentrismo e o amor. O egocentrismo subtende o conceito de liberdade e de separação. Já o amor representa a união, é a força reequilibradora da unilateralidade do egocentrismo. Se assim não fosse a criatura original seria uma unidade desequilibrada. Ao mesmo tempo em que concluímos que a perfeição está no equilíbrio entre duas forças opostas e complementares, não podemos cercear a manifestação isolada de qualquer uma destas duas forças. Assim, num sistema perfeito é direito da criatura a prática e o uso de seus atributos. Se o equilíbrio fosse determinístico não existiria a liberdade e nem o amor e desta forma o Sistema seria uma imposição escravagista.

Desta forma, podemos admitir que antes da queda as criaturas eram perfeitas e não imbuídas de inveja, de vaidade, de sede de poder, como você afirmou, pois participavam de um organismo harmônico e equilibrado. Estes defeitos surgiram devido ao uso de apenas um dos atributos: o egocentrismo. A liberdade é o princípio básico da individualidade (egocentrismo); o amor tem a função de contrabalançar a liberdade, pois, sem o ele não seria possível a existência de um organismo unitário perfeito. Vemos, assim, que a perfeição é o equilíbrio entre aspectos aparentemente contraditórios. Este equilíbrio foi rompido pela criatura usando a prerrogativa da sua liberdade em prejuízo do amor que cimentava o Sistema. Mas como a criação original era equilibrada por duas forças complementares o reequilíbrio tende a se restabelecer automaticamente (o que já vem acontecendo no atual período evolutivo). Fica claro agora que Deus havia previsto esta queda, pois criou um organismo perfeito capaz de curar a si próprio.

Do acima exposto fica patente que a noção de perfeição está intimamente ligada tanto a noção de individualidade como a de organismo hierarquizado. Em outras palavras depende tanto do elemento singular como do conjunto. A perfeição depende da individualidade, pois caso esta não existisse teríamos apenas uma substância divina indiferenciada, uma "geleia geral". Não se pode falar de perfeição onde não existe um termo contrastante. Se existisse somente a luz não seria possível a percepção, teríamos apenas um radiante caos indistinto. Quando se fala em individuação logo vem a idéia de sabedoria relativa e especializada, portanto a criatura não sabia das reais conseqüências do uso exagerado do dom da liberdade. O Sistema não podia interferir diretamente, pois desta forma estaria interferindo num direito natural do ser. Outro ponto que deve ser lembrado é que o risco é um pressuposto básico da prática da liberdade. Se o conhecimento era relativo para os elementos singulares não o é para o Sistema que é estruturado de forma a recuperar o equilíbrio perdido.

Concluindo podemos afirmar, sem medo de errar, que as criaturas eram perfeitas antes da queda. O que as levou a isto foi o uso legitimo da faculdade da liberdade, mas como o seu conhecimento era relativo a sua posição hierárquica não sabiam qual a extensão do risco que estavam correndo. Mas, felizmente, a sabedoria do Sistema as salvarão.

Creio que podemos tirar um ganho de sabedoria nas considerações acima. A busca da perfeição individual passa necessariamente na participação em um organismo coletivo. A perfeição só é completa na participação. Talvez aqui estejam os fundamentos lógicos do mandamento de Cristo: amar o próximo como a si mesmo.

Página Principal | Download | Biografia | Álbum Fotográfico | Relação dos livros | Links | Artigos |