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A INTELIGÊNCIA DO DIABO

Pietro Ubaldi

      Foi-me feita uma inteligente objeção. Em vários pontos da Obra tem-se afirmado que a queda do S no AS, isto é, a involução, leva a uma perda de consciência no estado da matéria, que representa a tumba do espírito. Destacou-se também o fato de que, quanto mais alta a posição do ser maior a sua potência, tanto mais profundamente ele fica sepultado na matéria, e, tanto mais denso o invólucro em que fica aprisionado.

      Dessas afirmações se pode deduzir que Satã deva ser o espírito reduzido ao máximo de inconsciência e de inércia. Ora, o que se constata é que Satã, entendido como personificação das forças do mal, em vez de permanecer projetado na matéria no ponto extremo da involução, não é nada inconsciente ou inerte. Ao contrário, ele dá prova de muita vitalidade, de um poderoso dinamismo, de uma astúcia incomum, a ponto de desafiar Deus. Como resolver essa contradição? Voltamos aqui a este argumento justamente para melhor explicar, a fim de que tudo fique claro.

      O princípio geral de que a queda no AS, isto é, a involução, leva a uma perda de consciência na matéria. Isto é o esquema geral do fenômeno na sua primeira parte, a involutiva, necessária premissa à segunda parte, a evolutiva, que é a que ora constatamos em nosso universo atual. Mas, quando se desenvolve uma teoria, é necessário ater-se às sua linhas gerais, sem divagar em detalhes e exceções que obstam à clareza e à unidade de exposição. Só num segundo momento se pode fazer esta outra parte do tratado, entrando nas particularidades e assim podendo dar um conceito mais exato do fenômeno.

      Trata-se de fatos de um caso particular. Devemos pensar que a queda da grande massa se tenha já realizado, porque vemos o nosso universo em fase evolutiva, ao menos até onde podemos conhecer. Na verdade, as qualidades do ser em evolução são limitadas, mas em via de retificação do tipo AS para o tipo S. no caso particular que ora examinamos, temos qualidades de potência e inteligência de tipo S, mas na direção invertida para o AS. Deve-se tratar então, não de emersões evolutivas vindas de baixo, mas de resíduos que no processo involutivo subsistem, porque ainda não foram precipitados na sua fase mais profunda. Estes seriam constituídos pelos elementos que, por serem mais potentes, sendo mais alto seu ponto de partida, têm melhor podido resistir à ação destruidora da queda, mas continuam impulsionados para baixo, ocupados com a construção do AS, e empenhados em arrastar todos para ele. Neste caso particular, aquilo que chamamos inteligência do diabo, típica por suas características, seria um resíduo daquela inteligência de origem, não destruída ainda, mas empenhada na descida e em via de destruição. Quando encontramos a inteligência unida ao mal, isto é, em posição invertida do AS, devemos admitir que estamos no caminho da descida. A presença da inteligência e sua potência nos mostram que o ponto de partida é o S. O seu emborcamento no mal comprova-nos que a direção é o AS. Assim se explica o poder do mal e a sua inteligência, fato cuja presença é inegável.

      O ponto central da contradição está no fato de que a involução leva à inconsciência, entretanto o mal que nesse caso a exprime e dá prova de muita inteligência. Ora, perguntamo-nos: é inteligência a que encontramos no mal? Seu modo de agir é o de um ser consciente ou de um inconsciente?

      Neste caso temos duas qualidades opostas que não podem estar juntas: a inteligência é qualidade do S e o mal qualidade do AS. aqui, entendemos por inteligência a verdadeira, sã, honesta, altruísta, construtiva, que é do S. a inteligência positiva, a do bem, não deve ser confundida com a negativa, do mal enferma, desonesta, egoísta, destrutiva, a da revolta. A do diabo é uma inteligência deste segundo tipo, isto é, invertida, revirada, perigosa não só para os outros, mas também para quem a usa, porque, fazendo o mal, o ser faz sobretudo a si mesmo. Mas então uma tal inteligência, que só prejudica a si mesma pode-se chamar inteligência ou não seria antes uma inconsciente loucura? Pode-se considerar inteligência ou não seria antes uma inconsciente loucura? Pode-se considerar inteligência esta que atinge o fim oposto ao desejado, trazendo o mal a si e aos outros? Mas essa é a luz das trevas, é a maior ignorância, que só serve para enganar e prejudicar sobretudo aquele que a possui, e que com ela se fere a si mesmo. E o próprio dinamismo, a outra qualidade do mal, serve para este fim, de autodestruição; ele também é negativo, lançado na direção involutiva. O dinamismo neste caso é invertido; não é vital, mas mortífero; não serve para conduzir à alegria, mas para aprisionar-se sempre mas no inferno da dor. Este é, de fato, o último resultado da inteligência e dinamismo de Satã: construir para si o próprio inferno.

      Eis em que consiste, na realidade a inteligência e dinamismo de Satã. A sua inteligência não passa de um resíduo corrompido daquela que foi a sua verdadeira inteligência no S, a que se empenha na felicidade do bem e não no inferno do mal. O mesmo se pode dizer do seu poder. Eis, pois, que temos uma inteligência e um dinamismo em descida, fortes ainda, que servem somente para enterrar-se, mas que estão em vias de enfraquecimento e anulação. Seus resultados invertidos para o mal e a dor nos mostram que aqui as trevas se estão fechando, porque estamos na via da descida.

      Recordemos que a queda não é a destruição do indivíduo, mas de suas qualidades. Este resiste, mas em posição invertida. Na matéria, de fato, a inteligência não está morta, porém somente aprisionada. Ela permanece, mas o indivíduo não é mais um senhor dela, é o seu servo. A involução leva a esse aprisionamento. O átomo é uma máquina complexa, bem calculada em cada parte e movimento. Mas a inteligência que dirige tudo isso não é mais a sua e sim a de Deus. A liberdade não pertence mais ao ser, que do próprio funcionamento não tem mais consciência nem poder diretivo. Nesse nível, vemos que desapareceram as qualidades do S, que voltarão a aparecer no homem reconquistadas com a evolução. Fica no átomo uma inteligência, mas não lhe pertence; fica em movimento, mas de forma obrigatória.

      Ora, a inteligência e o dinamismo do mal estão-se transformando nessa direção. Então, esta qualidade do S vai-se fechando, até tornar-se, como no átomo, um movimento automático, sem consciência e sem liberdade, dado que nisto consiste a inversão da positividade do S na negatividade do AS. Satã é já escravo do mal, não tem mais liberdade de escolha diante do bem, assim se está aprisionado no seu cárcere, que é o AS. Tal tipo de inteligência se fecha sempre mais no seu jogo astucioso. Em lugar de abrir-se para a luz do conhecimento da verdade, aquela inteligência naufraga na arte do engano. Então, quanto mais o ser desce, mais se torna faminto de vida insaciável como um câncer para roubá-la dos outros, porque cortou o canal do alimento vital que o ligava a Deus no S.

      O fato de que tal tipo de inteligência e de dinamismo seja de caráter maléfico, prova que eles pertencem à negatividade de AS e que estão em descida involutiva afastando- se do S. A posição é evidente. Se essas qualidades estivessem em ascensão para o S, deveriam ser do tipo benéfico, como aquelas que já aparecem no pecador que se está redimindo, mas que estão totalmente ausentes em Satã e seus companheiros. Mas nada impede que ele, Satã, também possa um dia redimir-se, iniciando o caminho da evolução. Esta não é, porém, a sua posição atual. O que está ocorrendo é justamente o contrário. Ele insiste deliberadadamente no mal com todas suas forças, usa toda a sua inteligência para abismar-se no AS.

      A explicação é lógica. Os rebeldes de menor potência caíram mais facilmente, atingindo mais rápido o fundo da trajetória da própria queda. Para as grandes massas o período de involução terminou. Mas os rebeldes de maior potência, dispondo, pela própria força, de maior possibilidade de resistência diante dos efeitos da queda, conservaram mais tempo suas qualidades de origem, embora em posição invertida do bem em mal. A sua descida está em curso, o que significa que estão lançados para a inconsciência e a escravidão da matéria, nas quais é fatal que caiam.

      Não há dúvida de que a atual inteligência e potência de satã atuam no sentido da revolta, usadas para confirmá-la, dirigidas, portanto, para baixo, o que só pode levar ao aprisionamento de todas as dimensões do ser. Outro destino não pode ter uma inteligência usada na direção anti-Lei, isto é, anti-Deus.

      Eis a natureza de inteligência do diabo. Quando se fala de inteligência, é preciso ver de que tipo se trata. Tem a aparência de verdadeira, mas na realidade pode ser apenas astúcia. É evidente que a inteligência que serve apenas para prejudicar os outros e àqueles que a possuem, não é inteligência, quando muito é a inteligência do louco, cuja finalidade é unicamente a autodestruição. Este tipo de inteligência quer enganar e acaba enganada. Pensando tirar vantagem quer fazer o mal aos outros e se não percebe que precipita na involução, fazendo-se mal a si mesma, enquanto a vantagem passa para os ofendidos que, com o sofrimento, podem redimir-se. Mesmo os loucos, a seu modo, são astutos. Mas seria justo chamar-se isso de inteligência? (P. Ubaldi - A Técnica Funcional da Lei de Deus - Cap. 13)

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